3.7.08
Visitas de estudo - Rufus Wainwright
[Após saber da sua ida ao concerto de Rufus Wainwright, na Casa das Artes de Famalicão, no passado sábado, lancei-lhe um repto no sentido de, querendo, escrever qualquer coisa sobre o espectáculo. Maravilhado fiquei quando percebi que ele levou a coisa a sério e cronicou a performance aqui para o tasco. Deixo-vos, então, muito bem acompanhados pelas palavras do meu amigo, colega e co-fundador do Minimalista de Schindler, Diego Armando Maradona Maria II...]




«A roupa dizia tudo. Sem plumas e cores espampanantes, trazia uma fatiota toda ela branca que atraía sobre si as luzes e os olhos. Foi assim Rufus: discreto e brilhante. O blazer transportava uma orquídea que se a certa altura se viu ameaçada pela fita da guitarra: "for this show I promised there would be no orchestration [orch-castration], so I can't kill this orchid". Foi assim Rufus: a solo com a sua voz, enchendo a sala quase com o esforço de um suspiro, com uma empatia e capacidade de comunicação singulares.
O concerto de sábado à noite em Famalicão começou quase sem se dar por ele. Rufus entrou sem holofotes apontados quando a sala ainda se acomodava, de maneira que quando o público realmente se apercebeu da presença do canadiano já ele se tinha lançado ao piano para começar a dedilhar o fantástico
Grey Gardens do seu segundo álbum, "Poses".
A partir daqui, Rufus Wainwright foi alternando entre o piano e a guitarra, passando por todos os seus trabalhos (já são 5), incluindo alguns clássicos incontornáveis (como
Cigarettes And Chocolate Milk e Hallelujah), com tempo ainda para tocar músicas novas (algumas das quais ainda em fase de aprendizagem, como Who Are You New York) e composições ainda por estrear (Famalicão foi presenteada pela primeira exibição do tema A Woman's Face, cuja letra é um soneto de Shakespeare).
Wainwright foi a estrela da noite e, sozinho, foi capaz de iluminar todo o firmamento da sua música, sempre com grande rigor e sem abdicar de uma exigência que mantém consigo próprio. A falta das orquestrações só se sentiu em alguns dos temas tocados com guitarra, e mesmo nessas a diferença só foi verdadeiramente notada porque Rufus fazia questão de preencher com a sua voz aquilo que faltava aos arranjos originais – por exemplo, tanto em
Califórnia (nesta chegou a deitar a língua de fora, tamanha era a exigência em termos vocais) como em Greek Song, Rufus usou a voz para reproduzir os solos.
Com uma voz limpa e sublime, o canadiano mostrou-se capaz de exibir todo o seu talento musical ao longo de um concerto de quase duas horas, bem como os seus dotes de entertainer, produzindo um verdadeiro "one man show" que lhe sai com uma naturalidade impressionante. O melhor reflexo dessa capacidade foi o silêncio e a atenção com que o público acompanhava cada música do princípio ao fim, deixando a exuberância e o aplauso para o último acorde dos temas e para as três vezes que, de pé, conseguiu chamar Rufus de volta ao palco para que este inundasse novamente a sala com a sua presença e a intensidade da sua música.
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California, Rufus Wainwright
Casa das Artes, Famalicão, 28.06.2008

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