27.3.08
Visitas de Estudo - Portishead no Porto
Ora, aqui está um caso estranho.
As reacções vão sendo díspares, entre a adesão semi-completa e a semi-frustração. Primeiro consenso, trata-se de um "semi".
Era um concerto que tinha tudo para dar certo, entre a nostalgia e a excitação. O primeiro problema tem de se colocar ao nível da organização. Um concerto de uma banda num registo intimista deve ser feito para gente sentada. Quanta gente achava que ia dançar ou fazer "mosh" a ouvir os de Bristol? Daí vem o segundo problema. Parece ser disparatado dizer que os Portishead não são os Xutos, mas a verdade é que o concerto começa e só muda a banda sonora. Gritos histéricos no fim de cada refrão de Glory Box parece parvoíce, palmas a compasso numa versão guitarra-baixo-voz de Wandering Star não parece bem e soam a absoluto desnexo quando batidas para acompanhar frases como «Can't anybody see/We've got a war to fight/Love will find our way/Regardless of what they say/How can it feel this wrong?(...)». E as 3.757 geringonças que foram filmando o início e as músicas mais conhecidas dos de Bristol? Foi o que aconteceu. Uma patetice.
Terceiro problema: primeiro concerto da digressão. A setlist estava equilibrada, mas com possibilidades de melhoramentos e a banda, em especial Beth Gibbons, deu a ideia de estar demasiado compenetrada no material novo. Daí que os clássicos fossem aparecendo a separar os temas de "Third" e talvez isso mesmo explique o facto de Gibbons ter-se enganado em alguns dos "clássicos" - desafinação em Sour Times (e aquele feedback impressionante do retorno de Gibbons...), repetição da letra em Cowboys, entradas fora do tempo em Glory Box (este a meias com Adrian Utley).
Parece então que o concerto foi terrível, não é? Mas não foi.

A coisa começou muito bem com Silence e Hunter, os dois primeiros temas de "Third", ao que se seguiu Mysterons. Perfeito. Depois veio, se a memória não falha, The Rip (que arrefeceu um pouco o ambiente da sala), ao que se lhe seguiu Glory Box e Numb. Depois uma tripla imbatível: Magic Doors, Wandering Star (um dos melhores momentos da noite, numa versão sem batida e com a substituição da melodia final do moog pela voz de Gibbons) e Machine Gun.
Até ao final do set ainda se ouviu Over, Sour Times, Only You, Nylon Smile e Cowboys (talvez não por esta ordem), que terminou com um quase inaudível (pela força dos aplausos) pedido de desculpas de Gibbons.
O encore foi demolidor: Threads pôs o Coliseu em sentido, em especial quando Gibbons a terminou em sonoro desespero, seguido desse pedaço de mitologia urbana que dá pelo nome de Roads e, para acabar, a hipnose de We Carry On, com Gibbons algures no início da plateia.
Terá faltado All Mine, Half Day Closing ou Strangers? É um "talvez" irrelevante, até porque estas músicas perdem muito sem os sopros e/ou as cordas.
Concluindo, foi um bom concerto que podia ter sido um enorme concerto, com culpas divididas entre a organização, o público e a própria banda. Uma óptima máquina a precisar de rodagem...
Talvez já hoje Lisboa veja uns Portishead e público melhores.

[Eu já vos tinha dito que o Geoff Barrow é uma máquina?! Impressionante!]


Strangers, Portishead
"Roseland NYC Live" (1998)

[E, antes que esqueça, obrigado, Joe, pelo bilhetinho mágico. És um compincha, "sócio"!]

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Olavo Lüpia, 27.3.08 | Referências |


8 Comments:


  • At 28 março, 2008 00:59, Blogger Menina Limão

    E AHAAH na primeira parte?

     
  • At 28 março, 2008 03:51, Blogger Olavo Lüpia

    menina citrina,
    se prometeres não me bater, digo-te apenas que o meu estômago ganhou aos ouvidos. quando entrei na sala, estavam a acender as luzes.
    creio ter sido por estas e por outras que se inventou e se tornou popular o uso da palavra "f*d@-se"...

     
  • At 28 março, 2008 04:02, Blogger Menina Limão

    qualquer pessoa já deixou uma ou outra vez (ou muitas) os seus próprios orgãos mandarem em si. :p

     
  • At 28 março, 2008 14:58, Blogger Sãozinha

    Ora ainda bem que gostaste do concertinho. Apesar de não ter sido perfeito, um mau concerto, quando é deste género, é sempre bom. E deste género, entenda-se do do fanatismo. A única vez que ouvi a Beth Gibbons a cantar ao vivo confirmei que nunca poderia gostar nem dela nem de nenhum grupo onde ela cantasse. Optei antes por litros de Super Bock Green.

     
  • At 28 março, 2008 18:07, Anonymous Anónimo

    Ainda estou a digerir o concerto de ontem (em Lisboa).
    A verdade é que as expectativas eram tão elevadas que de facto não posso dizer que tenham sido superadas.
    Em primeiro lugar não poderia concordar mais quando dizes que devia ser um concerto sentado. Ainda antes do concerto ocorreu-me se não seria interessante as pessoas sentarem-se no chão.
    Em segundo lugar a paranoia portuguesa de bater palmas ao minimo esgar é irritante. E finalmente, gostava tanto de ter ouvido a beth gibbons cantar sozinha o Roads por exemplo. Eu percebo que as pessoas queiram entoar as músicas em conjunto mas por vezes é desnecessário.
    Achei o público desordeiro para um concerto de Portishead. Há silêncios que deviam ser respeitados, palmas evitadas,telemoveis e maquinas fotográficas guardadas no bolso. Às vezes dá a sensação que as pessoas vao aos concertos para por o vídeo no youtube. Por isso é que gosto dos concertos de Sigur Ros, nunca nada se repetiu daquela forma como no coliseu em 2005. Um silêncio magistral e palmas no fim.
    Peço desculpa por comentário tão extenso!

    PS: ainda assim foi um bom concerto! Precisam de mais rodagem!

     
  • At 28 março, 2008 18:49, Blogger Menina Limão

    não estive em nenhum dos concertos, mas conheço bem esses sintomas do público e, de um modo geral, concordo com as críticas do Martini. "Às vezes dá a sensação que as pessoas vao aos concertos para por o vídeo no youtube." - precisamente. e também é verdade que não me lembro de nenhum concerto cujo silêncio tivesse sido mais respeitado que o dos Sigur Rós, ainda que não tenha sido o mesmo (eu vi-os há muito mais tempo).

     
  • At 28 março, 2008 23:06, Anonymous Anónimo

    Os tempos modernos são, de facto, outros. Ou será mais o fenómeno p.i., não sei... mas ver concertos no sec. XXI é diferente, como diz hoje o Vitor no Público.

    Para além da chamada de atenção do Olavo para as centenas de telemóveis virados para o palco (mas será que se paga o bilhete para ver o concerto ou para filmar?), achei muita piada a um outro fenómeno:

    No final do concerto, a saída do Coliseu do Porto tem assim uma espécie de "varanda", espaço aberto mas ainda debaixo da protecção de telha, onde o povo se deixa ficar a tirar impressões sobre o concerto e sobre a corcunda cada vez mais pronunciada da Beth.

    Repararam na nuvem de fumo que envolvia toda a gente? IMPRESSIONANTE!!!

    E só depois é que me lembrei que este foi o primeiro concerto a que fui, na era pós-proibição de fumar...

    Um abraço do Binhó...

     
  • At 28 março, 2008 23:26, Blogger Olavo Lüpia

    é uma questão engraçada.
    no concerto do rufus wainwright sentou-se o público (e o canadiano até tem algumas músicas que puxam à movimentação) e... nem uma câmara/telemóvel/máquina se viu. Mas mais, o respeito do público fez, por exemplo, com que o Poses ou Cigarettes and Chocolate Milk, a regime piano & voz, se tornassem absolutamente sagrados - posso garantir que ninguém estava a palitar os dentes na sala, porque ouvir-se-ia, fosse o caso.
    um amigo meu disse que teve de passar o dia de de ontem numa dieta exclusiva de "Roseland NYC Live", tal o nojo!...
    (como vês, martini, comentários grandes também valem!)

    grande binhó,
    sabes que quando a b. gibbons deu o primeiro "prego" pensei: «ah!, se ela apenas pudesse fumar...».
    maldita lei...

    abraços/beijos (riscar o que não interessa)